As relações diplomáticas entre o Brasil e a Santa Sé são sólidas e antigas. Mais do que simbólicas, essas relações estão formalizadas em acordos internacionais vigentes que reconhecem a atuação da Igreja Católica em território brasileiro. Neste artigo, você vai entender quais são esses tratados e o que dizem sobre temas como assistência religiosa, imunidade tributária e ensino religioso. Ao final, analisamos juridicamente se os padrinhos de batismo podem ser reconhecidos como parte da família extensa, à luz da legislação brasileira e do Direito Canônico.
Tratado 1: Acordo sobre Assistência Religiosa às Forças Armadas
Data do acordo: 23 de outubro de 1989
Promulgado no Brasil por: Decreto nº 119-A, de 7 de janeiro de 1890
Este acordo tem como objetivo garantir assistência religiosa aos membros católicos das Forças Armadas do Brasil. Com ele, foi criado o Ordinariado Militar, uma circunscrição eclesiástica equivalente a uma diocese.
Principais pontos:
- Nomeação de um Bispo Militar, com aprovação da Santa Sé e conhecimento do governo brasileiro;
- Atuação dos capelães militares, que acompanham espiritualmente os soldados e suas famílias;
- Garantia de liberdade religiosa nos ambientes militares.
Referência Canônica:
- Cânones 368 a 374 do Código de Direito Canônico: sobre dioceses e outras circunscrições eclesiásticas.
Base constitucional:
- Art. 5º, VI da Constituição de 1988:
“É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida […] a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva.”
Tratado 2: Acordo sobre o Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil
Assinado em: 13 de novembro de 2008
Promulgado por: Decreto nº 7.107, de 11 de fevereiro de 2010
Aprovado pelo Congresso: Decreto Legislativo nº 698/2009
Esse tratado regula a atuação jurídica da Igreja Católica no Brasil, fortalecendo o reconhecimento de suas instituições e o diálogo com o Estado.
Principais garantias do tratado:
- Reconhecimento da personalidade jurídica canônica da Igreja e de suas instituições;
- Casamento religioso com efeitos civis, desde que registrado;
- Ensino religioso facultativo nas escolas públicas de ensino fundamental;
- Imunidade tributária sobre bens e atividades relacionadas à missão religiosa.
Referência Canônica:
- Constituição pastoral Gaudium et Spes (Concílio Vaticano II), sobre a presença da Igreja no mundo moderno.
Base constitucional:
- Art. 5º, VI: Liberdade religiosa e de culto.
- Art. 150, VI, b:
“É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir impostos sobre templos de qualquer culto.”
Os padrinhos de batismo fazem parte da família extensa?
Uma dúvida comum diz respeito à posição jurídica e social dos padrinhos de batismo: será que eles são considerados membros da chamada “família extensa”?
Segundo o ECA, sim — dependendo do vínculo
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA):
Art. 25, parágrafo único:
“Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende para além da unidade pais e filhos […], formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade.”
Ou seja: padrinhos não são parentes consanguíneos, mas podem ser reconhecidos como parte da família extensa se mantiverem convivência constante e afeto comprovado com a criança ou adolescente.
Isso pode influenciar decisões em casos de guarda, convivência familiar e até em processos de adoção.
Na Igreja Católica: vínculo espiritual, não civil
Segundo o Código de Direito Canônico, o papel do padrinho é essencialmente espiritual:
- Cân.872:
“Dê-se, na medida do possível, ao batizando um padrinho, cuja função é assistir […] e cuidar que o batizado leve uma vida cristã conforme o batismo.” - Cân. 873-874:
O padrinho deve ser católico, confirmado e com vida coerente com a fé.
Resumo: na Igreja, o padrinho é um acompanhante na fé, não um familiar legal. Mas culturalmente, no Brasil, ele é tratado como membro da família — “compadre”, “comadre” — reforçando o valor do vínculo.
Conclusão
Os tratados entre Brasil e Santa Sé demonstram que a presença da Igreja Católica no país vai além da religião: ela está juridicamente reconhecida e integrada à sociedade civil, em especial na educação, assistência religiosa e liberdade de culto.
Por sua vez, os padrinhos de batismo, embora não sejam parentes legais, podem sim ser considerados família extensa, quando existe convivência afetiva e estável. A legislação brasileira, sensível às relações humanas além da consanguinidade, permite esse reconhecimento, especialmente em benefício das crianças e adolescentes.
Fontes utilizadas
- Constituição da República Federativa do Brasil (1988)
- Código de Direito Canônico (1983)
- Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei nº 8.069/1990
- Decreto nº 7.107/2010 – Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil
- Decreto nº 119-A/1890 – Acordo sobre Assistência Religiosa às Forças Armadas
- Site do Vaticano – Acordos Internacionais
- Senado Federal – Legislação e tratados